http://revistacult.uol.com.br/home/2010/05/o-crime-de-lady-gaga/comment-page-2/#comments
Não vamos aqui reproduzir a matéria na íntegra. Mas postaremos os vídeos que são citados na matéria, intercalados com trechos desta e comentários nossos, sem indicação de autoria, como nos clipes.
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No vídeo de “Paparazzi” fica exposto o amor-ódio que um homem nutre por uma mulher, a invalidez à qual ela é temporariamente condenada por sua violência e, por fim, uma vingança inesperada com o assassinato desse mesmo homem. “Incitação à violência”, pensarão as mentes mais simples; “feminismo como ódio aos homens”, dirá a irreflexão sexista acomodada, quando na verdade se trata de uma irônica inversão no cerne mesmo do jogo simbólico que separa mulheres e homens.Tarantino com Marlyn Manson. Com direito a citação de “Um corpo que cai” na hora em que o amante joga a moça do alto da sacada. Alias, a mesma discussão do clip está no filme. O imagem\corpo da mulher sexy = imagem da mulher morta, desejo final do masculino. O clip coloca várias imagens de mulheres\fetiches mortas (empregada, enfermeira), sem esconder que tudo isso é pra ralizar a equação Gaga=imagem=dinheiro. A solução final é a mesma que Tarantino vem propondo em seus últimos filmes, com a coroação da assassina, desde que continue posando gostosa\morta.
Se em “Paparazzi” o deboche beira o perverso autorizado psicanaliticamente (a mulher sai da posição deprimida ou melancólica e aprende a gozar com seu algoz, que ela transforma em vítima), em “Bad Romance”, “o vídeo mais visto de todos os tempos”, mulheres de branco – como noivas dançantes – surgem de dentro de esquifes futuristas para curar uma louca que chora querendo ter um “mau romance” com um homem. Um contraponto é criado no vídeo entre a imagem do rosto da própria Gaga levissimamente maquiado, demarcando o caráter angelical de sua personagem, em contraposição ao caráter doentio da personagem da mesma Gaga de cabelos arrepiados e olhos esbugalhados. Entre eles a bailarina sensual junto de suas companheiras faz o elogio do corpo que é obrigado a se erotizar diante de um grupo de homens.
A noiva é queimada. Sobre a cama, no fim, a noiva como um robô um pouco avariado, mas ainda viva, contempla o noivo cadáver. A ironia é o elogio do amor-paixão, do amor-doença e morte ao qual foi reduzido o amor romântico pela estética pop da ninfa pós-feminista. O feminismo só tem a agradecer.
A noiva vai para seu compnaheiro como quem vai para o abate. O expectador está representado pelos marmanjos para quem as moças rebolam, rastejam, imploram pelo amor, como máquinas ou, como prefere Gaga,like a dog. No final, o desgraçado frita na cama, incendiado, e Gaga fuma seu cigarro ao lado da ossada do que um dia foi (será?) um homem. Nesse clip, a mensagem é mais simples e direta, e a música é inferior.
Em “Telephone”, a estética eleita é a da lésbica e da pin-up. Ambas criminosas. A primeira por ser uma forma de vida feminina que dispensa os homens, a segunda por ameaçá-los com uma estética da captura (a mulher-imagem-de-papel, a mulher “cromo”, a mulher-desenho-animado que configura o conceito do “broto”, do “pitéu”). No mesmo vídeo o personagem de Gaga compartilha com Beyoncé uma cumplicidade incomum entre mulheres.
Esse sinal é dado no meio do vídeo, quando Beyoncé vai resgatar Gaga na prisão e ambas mordem um pedaço de pão, que logo é lançado fora como algo desprezível. A comida mostra-se aí como o objeto do crime. O vídeo é mais que um elogio ao assassinato do mau romance, ou da vingança contra o evidente amor bandido de quem a personagem de Beyoncé quer se vingar. Trata-se de uma profanação da comida pelo veneno que nela é depositado. O amor bandido é morto pela comida, uma arma simbólica muito poderosa associada à imagem da mulher-mãe, da mulher-doação, dedicada a alimentar seu homem na antipolítica ordem doméstica.
O palco é a lanchonete de beira de estrada como em Assassinos por Natureza, de Oliver Stone. O assassinato é o objetivo do serviço das duas moças perversas que, no fim do vídeo, dançam vestidas com as cores da bandeira norte-americana – meio Mulher Maravilha – diante dos cadáveres de suas vítimas, já que, além do amor bandido, todos morreram. Cinismo? Sem dúvida, mas como paradoxal autodenúncia.
Mas o maior crime de Gaga, aquilo que fará com que tantos a odeiem, não será, no entanto, o feminismo sem-vergonha que ela pratica como uma brincadeira em que o crime é justamente o que compensa? E, como ídolo pop, não poderá soar aos mais conservadores como um modo de rebelar as massas de mulheres subjugadas pela perversa autorização ao gozo, doa a quem doer?
Mais mulheres exibidas em condição de submissão, condição do gozo masculino. Dessa vez atrás das grades, em roupas bem curtas, com direito a censa de lesbianismo e briga de mulher. Tudo o que queremos ver, mas sempre com certo estranhamento - a própria Gaga - que ora parece um et, ora usa óculos feitos de cigarros, ora com um penteado feito com latas de coca cola. Signos deslocados.
Pois é, o "feminismo" agora também vende, assim como vendem as reivindicações dos negros na estética hip hop, representados aqui por
Beyonce. As citações aumenta, Kill Bill, Michael Jackson, Oliver Stone. Ao final, homens maquiados na cozinha, orquestrados por Gaga (assassina por natureza) a ampliar o escopo de sua vingança. Dessa vez, ela mata todos os que estão no restaurante multicultural, Negros, brancos, mulheres orientais, e dança alegremente vestida com a bandeira americana. Tudo em nome do amor, do cinismo, da mercadoria, e de si mesma.
Tarantino devia muito filmar um clip da moça.
Pra completar, um vídeo da gata ao piano, mostrando todo seu talento e versatilidade. Colagem de estéticas – a era da canção acabou? – e domínio total do espetáculo. Ela toca inclusive com o pé.

Em Um Corpo que Cai (Vertigo), o mestre Hitchcock está em sua melhor forma. Acredito que seu maior talento consiste em multiplicar camadas de significados sem que nenhuma delas rompa completamente umas com as outras, truncando o fluxo da narrativa. Vertigo é tudo o que Cristopher Nolan queria fazer em seu ambicioso A Origem, mas que foi perdido em um formalismo exibicionista. Aliás, revendo Metrópolis, de Fritz Lang, percebi que A Origem cai num problema similar ao proposto por aquele filme: como multiplicar camadas de significado sem fazer com que o público se perca completamente nas associações? A solução de ambos foi apelar para o didatismo, o que não tira a força de Metrópolis, especialmente por seu caráter alegórico que sempre direciona o sentido para outro lugar, mas empobrece muito a narrativa de Nolan, prendendo o espectador à forma e ao brilhantismo egocêntrico do diretor. Foi o preço pago pela inovação – as camadas de significado vão sendo inseridas bruscamente ao longo do filme por meio de cortes radicais que inserem novas camadas narrativas, e não uma multiplicidade de sentidos presentes desde o início. É o que Leonardo Di Caprio deixa bem claro, uma idéia bem simples (no fundo, uma questão de cunho comercial) que precisa se tornar um grande aparato hollywoodiano, o filme que assistimos. No frigir dos ovos, entretanto, a forma se sobressai e atoniza o conteúdo.
A experiência de assistir a um clássico do cinema mudo com acompanhamento ao vivo, remetendo à experiência cinematográfica de tempos passados nesse caso valeu mais pela projeção do filme em tela grande do que pelo aspecto musical. Não digo que esta de nada valeu. Valeu sim, especialmente por seu caráter de fetiche, a busca por uma experiência cinematográfica mais autêntica, tal qual vivenciada nos cinemas de antigamente, bem ao gosto pós-moderno de reatualização descafeínada da história. Isso sem falar que participar de uma sessão ao ar livre de um filme cult acompanhado por uma orquestra sinfônica é o suprasumo da “elevação” espiritual e bom gosto\nível sócio cultural – capital simbólico de sobra, o que não é pouca coisa e pode decidir eleições. Quanto à experiência em si, pode-se dizer que depois de alguns minutos o expectador nem sente mais a diferença entre o acompanhamento com orquestra e aquele que estamos acostumados no DVD, tornando-se óbvio do porque daquilo se chamar música de acompanhamento – algo semelhante acontece quando vamos assistir a algum filme em 3D, e após alguns minutos o seu cérebro deixa de apreender aqueles efeitos enquanto novidade, o que inevitavelmente acaba retirando um pouco da graça do esquema, caso o barato do filme seja exatamente o “efeito pelo efeito”. A execução da partitura pela orquestra não ocupa o primeiro plano e, caso o ouvinte mantenha nela sua atenção, é provável que se sinta desapontado, pois a partitura não é assim tão boa – tem uns jazzinhos aqui, outra coisinha ali, mas nada de mais. Acredito que seria melhor para o filme se o som de acompanhamento fosse algo mais experimental, futurista. Não algo radical como atonalismo ou música serial – ninguém merece 3 horas de atonalismo - mas alguma coisa caída para um Varèse, ou Shostakovsky.





r-se com futebol, o torcedor carrega para dentro de si essa magiquinha que reforça o vínculo instintivo e misterioso entre a beleza dos chapéus do Pelé e o espírito profundo do Brasil, cuja imagem mais perfeita está naquele passado de tolerância, labilidade e desrecalque que fez a glória da cultura brasileira como um todo. Por sua vez, essa mesma imagem, através da inconsciência e do ardor amador do torcedor contemporâneo, sustenta ilusões preciosas para a manutenção do status quo no presente. E isso tanto mais quanto menos se encontra nas ruas um rastro sequer do belo país.



