terça-feira, 20 de julho de 2010

Sobre a nova propaganda do Renault Clio (1\2)

O blog anda às moscas. A vida virtual e a real podem ser incompatíveis, enfim, ao invés de complementares. Todos sabemos disso. Assim como para alguns, o mundo virtual parece ter mais concretude. E assim também, o que é mais grave, nossa vida real se torna cada dia mais virtualizada, valores e atitudes imagéticas. Os comerciais tornam-se mais interessantes que a própria vida, o que não seria problema nenhum (o sentido geral da ficção é tornar mais viva a vida) caso nossa vida não estivesse tornando-se, por principio, ficcional. E a propósito de comerciais e vidas esvaziadas, segue um texto excelente de um brother do peito. E quem diria que a consciencia crítica dos modernos se converteria no cinismo atual. O que significa ter consciência crítica nesse caso? E para que serve crítica ideológica então, se é que já serviu pra alguma coisa? Mais instrumentos para o cinismo?



Dois amigos vão andando pelas ruas, conversando. A rua já tem aquela cara de background de novela (cores chapadas, luz fosca). São sempre os mesmos dois atores que estão ali; as transformações acontecem como mudanças de figurino.

A lógica da propaganda é a seguinte: cada coisa que o cara diz é contrariada em seguida. Por exemplo, "a coisa mais ridícula é andar de patins". De repente eles aparecem, os dois amigos, vestidos como patinadores. A transformação é "mágica" e muito rápida, acontece do nada mesmo.

Essa mesma sequência segue, pautada pelos assuntos comentados pelo rapaz, passando por "trabalhar em empresa" e "casar". Quando é chegado o "casar", o amigo como que cai num buraco. Logo em seguida sobe por detrás (como um boneco de pimbolim) uma mulher vestida de noiva. Imediatamente ele também se transforma em noivo.

O ponto final das transformações, claro, é quando aparece um Renault Clio. Nesse momento todo o exterior some, estamos dentro do Clio. É aí que o cara fala algo como "você é tudo pra mim, querida" e a mulher olha com uma cara desconfiada. No corte entre a "externa" e a"interna", uma voz em off comenta algo do tipo: "você vai se contradizer sempre. Esse carro é um popular que não é popular, experimente", ou qualquer merda do tipo...

O cara que vendeu essa ideia para o diretor de marketing da renault não precisou dizer muito mais do que "a renault precisa investir na sua linha de carros populares, mas manter o padrão "importado" que é a razão pela qual nossos clientes nos escolhem. Por isso a gente tem que desfazer a aura de pobreza do carro popular. Pra fazer isso, é claro que a gente precisa mostrar pros recalcitrantes que eles já fazem opções popularescas mesmo que eles não saibam e ao mesmo tempo dizer que esse nosso popular não é como os outros.

Mas isso é só o começo da história...

O que caracteriza essa propaganda é a generalização da relatividade das coisas. Ela parte do pressuposto de que a noção cínica de que opiniões e crenças não contam é uma lei geral da vida hoje. Segundo essa propaganda todos precisam viver desavisadamente, aceitar como verdadeiro tudo o que aparece, mas sempre com o olho nas mudanças que desmentem a verdade do que se acreditou. É essa ideia que esse comercial quer estabelecer como geral, apesar de ter público-alvo certo.
Para fazer isso formalmente, toda a "cenografia" do reclame ganha algo de artificial e a lógica é sempre a de denunciar essa aparência como aparência. A propaganda não diz "compre o Clio"; não diz "Clio, elegância e conforto ao seu alcance"; ela diz que os ideais de elegância e conforto em que você acredita são relativos, sempre substituidos por outros conforme chega um novo produto (na verdade, diz algo mais grave, comentado a seguir); ela sabe que você sabe disso, e, assim, apelando para a sua experiência como consumidor, te vende a mesma ideia.

Um comentário:

  1. O ser humano sempre foi assim e sempre será!Nós nunca prestamos atenção no que realmente é necessário, mas sim nas nossas necessidades de consumo, status!O tema é o carro, o Clio é um carro pequeno, popular, gasta pouco e não tem lá uma beleza, um bom desenho, mas me leva para onde eu quero e faz a mesma coisa que os outros modelos fazem, anda!Em contrapartida, os carros mais luxuosos são mais caros, gastam mais e marcam no velocimetro uma velocidade que é proibido ultrapassar e não é tão necessária.Então para que eu quero um carro que chega a 250Km se não posso passar de 110Km?!Ao meu ver, esta propaganda nos faz pensar nas nossas reais necessidades e até que ponto ou fase da vida, iremos defender essas idéias.Ou seja, o homem é um ser mutante!

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