sábado, 10 de maio de 2008

O corajoso e polivalente Mel Brooks


Sei que ninguém está muito interessado em opiniões pessoais sobre qualquer assunto. O negócio é fazer download... ainda mais quando os textos são grandes assim. Eu pelo menos não tenho muita paciência pra ler artigos ou ensaios longos na net. Mas o legal da internet é isso... como não é pra vender, voce pode publicar o que quiser sem se importar se alguem vai se interessar ou não.. e no fundo no fundo... vai que alguém se interessa... Então vamo ae!
Eu gosto muito de Month Python. Acho os caras fodas de verdade. Mas seu humor é refinado demais pra mim, criado no Brasil a base de Chaves e Trapalhões. Piadas sobre declinação latina (como na Vida de Brian), por mais engraçadas que sejam, e por mais que sejam feitas pra ridicularizar, tem um sabor acadêmico de classe média que se distância um pouco (verdade que, infelizmente, não o suficiente) da minha pegada. Eu dou risada com os caras, mas o que me faz mijar e chorar mesmo é o Chaves (ainda vou escrever alguma coisa aqui sobre o seu Madruga, a meu ver um comediante verdadeiramente extraordinário), Chaplin, Corra que a polícia vem aí, Borat, Mel Brooks, Ronald Golias, uma coisa por assim dizer menos sutil, mas igualmente excelente. Lembrando ainda que não se trata aqui de juízo estético, mas só uma consideração daquilo que eu acho mais divertido, ou que eu prefiro, por uma conjunção de fatores subjetivos e históricos.
Mel Brooks é geralmente definido como um excepcional diretor de paródias, um tipo de comédia que satiriza alguns gêneros hollywodianos. Fez sátiras de filmes de ficção científica (S.O.S – um louco a solta no espaço), faroeste (Banzé no Oeste), suspense (Alta-ansiedade), filme mudo (A última loucura de Mel Brooks), terror (Jovem Frankstein e Drácula, morto mas feliz), filmes bíblicos (História do Mundo Parte I), aventura (As loucas aventuras de Robin Hood), sempre de forma competente e, principalmente, muito engraçada. Mas ainda que seja um verdadeiro mestre no gênero, tal definição só recobre um aspecto do talento do sujeito. Seu tipo de paródia difere bastante de outros filmes clássicos do gênero – a típica comédia besteirol, que se tornaria uma verdadeira indústria a partir dos anos oitenta. Por exemplo, o tipo de humor da turma do ZAZ, autores de clássicos como (Apertem os cintos, o piloto sumiu, Corra que a polícia vem aí, Top Secret, etc. Isso porque Brooks não direciona suas tiradas para os clichês de cada gênero que, nos melhores casos, ao serem expostos ao ridículo tem seu caráter absurdo (de coisa forçada, construída) desmascarado, ou apenas servem de pretexto para fazer uma piada – como nos inúmeros besteiróis adolescente insuportáveis. É claro que ele também faz isso, mas seu diferencial consiste em considerar o gênero enquanto portador de uma determinada ideologia, que será criticada ou desmascarada a partir da paródia. Algo como voltar um gênero contra ele próprio, inserindo (ou retirando) algum elemento essencial a este, para que este crie um curto circuito em sua estrutura, que é fechado por princípio, ou seja, possui regras e valores que precisam ser respeitados para ser considerado enquanto tal.
Primavera pra Hitler (1968), o primeiro filme de Brooks, conta a história de um produtor e seu advogado, encrencados financeiramente, e que tem uma idéia bastante original pra sai desta: montar um espetáculo para que seja um total fracasso. Para tanto contratam atores ruins, equipe péssima, e resolvem montar um musical romântico na Broadway cujo mocinho é Hitler. Nem precisa dizer que a peça se torna um sucesso de crítica e público. O roteiro fantástico é uma crítica tanto ao sistema de entretenimento americano (teatro, musicais), que aceita qualquer coisa desde que se transforme em ouro, como é também uma espécie de cartão de apresentação do diretor, como que dizendo qualquer coisa, tratada da maneira adequada, pode ser piada. Isso sem contar que a turma do politicamente correto (que oculta a sujeira debaixo do tapete pra fingir que ela não existe e poder levar uma existência sem culpa) fica de cabelo em pé quando vê humor sendo feito a respeito do nazismo. E como se não bastasse, Mel Brooks (eita judeu porreta esse) ainda repete a dose no extraordinário Sou ou Não Sou, uma adaptação de uma peça de teatro sobre um grupo de teatro na polônia na época da ocupação alemã. Outro roteiro bastante corajoso, com piadas e atuações fabulosas. O cara é também muito talentoso como ator, diga-se de passagem.
Outro exemplo de sátira fantástica de Brooks está naquele que é talvez seu melhor filme, Banzé no Oeste (1974). A história: um ‘típico’ bandido de faroeste quer destruir uma cidade pra poder construir sua estrada de ferro no local. A partir desse ultra clichê de bang bang (essa onomatopéia é muito melhor que o nome faroeste), Brooks começa a subverter tudo. Começando com a grande sacada do filme: um dos planos do bandido é colocar um xerife negro na cidade. Nem pense em baboseira como James West, em que o mocinho poderia tanto negro como branco, amarelo, verde ou roxo que não faria a menor diferença na estrutura da obra. O filme tem algumas de suas melhores piadas tiradas de situações de racismo, e outras tantas com relação ao homossexualismo, com drogas, manipulando esses elementos pra fazer humor, sem tratá-los como tabus, mas tampouco considerando como a coisa mais normal e saudável do mundo.
A crítica ao racismo (mal) dissimulado nos faroeste – considerado portanto como um representação ideológica da estrutura daquela sociedade - gera alguns dos momentos mais hilários do filme, como quando o xerife e seu parceiro (Gene Wilder, loiro de olho azul) decidem chamar a atenção de dois membros da Klu Klux Klan – pois é, Brooks mistura tudo mesmo, tudo serve como piada. Wilder grita para os dois ‘ei, olha o que eu tenho aqui’, e o xerife aparece por detrás de um rocha dizendo do modo mais caricatural possível, como um monstro de filme B, ou um negro dos filmes de Hollywood e das nossas novelas: ‘eu onde estão as mulheres brancas?’. Ou quando um grupo de índios cerca uma caravana, e estas começam a andar em círculo para se proteger, só que a carruagem dos negros é proibida de entrar no círculo junto com a dos brancos, e fica então rodando pateticamente em torno de seu próprio eixo, sozinha. Ou ainda em outra cena, após uma velhinha responder aos comprimentos educados do xerife com um ‘vai a merda crioulo’ (níger), Gene Wilder fala ao xerife: “O que você esperava? Seja bem vindo filho... sinta-se em casa... case-se com minha filha? Lembre-se, eles não passam de agricultores... são gente da terra... o barro do novo oeste. Você sabe... babacas idiotas!”. O que Brooks faz nesse filme não é apenas uma paródia do gênero (na verdade, são muitos as escolas parodiadas no filme, desde musicais até desenho animado, nada escapando a demolição – literal, como se observa ao final), mas uma crítica pesada à ideologia (no presente) transmitida pelo mito fundacionista do velho oeste, com direito a um tom muito característico dos anos 70.
Humor inteligente, sem concessões, ousado e corajoso, como está difícil de encontrar nos filmes ultimamente. O que de melhor se tem feito em termos de humor tem de ser procurado nos desenhos – e salve Simpsons - desde que aquela boa safra de comediantes dos anos 80, saídos de quadros humorísticos da TV (John Belushi, Eddie Murphy, Bill Muray, Steve Martin, Leslie Nielsen, Chavie Chase, etc...) ou morreu ou simplesmente perderam a graça. Agora Ben Stiler e Adan Sandler ninguém merece. Por favor, até o Ernest que passava todo dia no SBT (lembram dele) é mais engraçado do que esses caras.
Filmografia:

3 comentários:

  1. Como você disse o negócio é fazer download, ninguém pára pra ler nada. É verdade. Mas eu parei pra ler porque estava buscando Mel Brooks e acabei em seu blog, me sentindo atraída por esse post e tendo que comentar que aplaudo de pé suas palavras sobre o verdadeiro e bom humor das comédias que não vemos mais há muito tempo. Gostei muito do que você falou e bateu uma saudade nostálgica das comédias dos anos 80. Era isso que eu estava fazendo antes de cair aqui: buscando as boas comédias antigas pela web para matar a saudade desse gênero que não tenho achado graça nem vontade de assistir há muito tempo.
    Parabéns pelo post!

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  2. Obrigado pelas palavras Lara... demorei tanto pra responde porque só hoje, depois de 3 anos de blogueiro, eu descobri a ferramenta em que da pra acompanhar os comentários... kkk que fiasco. Mas que bom que vc gostou do texto. Valeu.

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  3. Realmente, Mel Brooks é um dos poucos que podemos chamar realmente de comediante.

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