sexta-feira, 6 de julho de 2007

O que é música pop? Tratado definitivo.

Nossos milhares de leitores diários tem cobrado insistentemente de seus colunistas o esclarecimento de alguns conceitos do qual eles discordam, ou simplesmente não entendem. Uma delas é o conceito de ‘música de preto’, tão constantemente aludido. Resolvi, não obstante, tratar de um outro, menos óbvio: o de música pop. Não sei o que pensam os demais editores de tão respeitável órgão de comunicação, mas tenho a honra de aqui compartilhar minha opinião pessoal a respeito do tema, agradecendo desde já a colaboração de alguns eminentes professores universitários que preferiram ficar incólumes, mas que com certeza já foram lidos pelos senhores, sendo no mínimo embaraçoso caso eu esteja equivocado – não para mim, evidentemente.

Acredito que só dá pra falar que algo é Pop por comparação. Chico Buarque é mais pop do que Tom Zé, que por sua vez é mais pop do que Xenaxis. E isso não tem a ver – diretamente, porque de forma indireta tem tudo a ver - com o sucesso alcançado por esses artistas, e muito menos com o valor artístico de cada um. Pop pra mim é uma espécie de instrumento de medida, que verifica o grau de proximidade de determinado artista (ou obra) em relação à um padrão, variável de acordo com cada caso. Dessa forma, o pop deixa de ser um conceito fixo, adquirindo funcionalidade a partir das relações concretas que se pretende estabelecer. Algo pode ser pop em relação a uma coisa e experimental em relação a outra, ou ser pop em um momento e deixar de ser em outro.

O legal dessa ideia é que eu posso estabelecer comparações sem noção, por exemplo, falar que Mozart é musicalmente mais pop que Jorge Ben. Outra vantagem é que a realidade (ao menos em princípio) não se subordina à um conceito pré determinado, ao menos tempo em que se evita o impasse de não conseguir criar conceitos a partir de uma realidade dinâmica. Pode até parecer meio estranho, mas de fato a gente vê isso a toda hora. Por exemplo, a noção de raça, que só faz sentido dentro de cada contexto específico, mudando de sentido a todo momento. É impossível tirar uma definição de raça que elimine a ambiguidade concreta, mas se você quiser saber quem é preto é só colocar dois manos na frente de um policial e perguntar em quem ele gostaria de atirar primeiro. O conceito é variável e extremamente móvel, mas existe e passa bem, obrigado.

Tendo isso em vista, dá pra dividir a música em pop e experimental, mesmo que seja só um lance subjetivo. Pensando em relação à música Ocidental pós indústria fonográfica, (acabo de criar uma sigla nova M.O.P.I.F) experimentais são as que se afastam do padrão de mercado (de novo sem juízo de valor), ou do padrão cultural predominante – por exemplo, a noção de tonalidade, ou uma certa concepção rítmica e harmônica. A música de concerto ‘contemporânea’ (Ligetti) pega essas concepções e tenta negá-las uma a uma, mais ou menos como Godard tenta fazer com o cinema hollywoodiano. Já um canto ritual da tribo Bororo se afasta do padrão Ocidental por seguir uma lógica anterior (ou paralela, mas com outra base) à modernidade (que é capitalista, branca e muito macho).

A música pop, por sua vez, é a que se aproxima do que se afasta a experimental. Dentro dela, milhares de subdivisões e elementos complicadores. Geralmente eu costuma pensar a música pop de qualidade dividindo-a em duas vertentes. Uma que pela mescla com elementos heterogêneos, ou por trabalhar de forma diferenciada com algum aspecto musical, seja lá qual for, se aproxima do experimentalismo, sem deixar de conter elementos pop (as pirações da Tropicália, ou do Krautrock alemão, Tom Zé, Itamar Assumpção, Nação Zumbi ou, em outra linha, os filmes do Kubrik). E outra, o pop-pop mesmo, que trabalha com os padrões mercadológicos sem forçá-los, mas realizado por artistas muito competentes, que conseguem trabalhar com aquela linguagem de modo a levá-la a um grau de excelência elevado.

É claro que dentro dessas categorias tem muita porcaria, mais aí eu chamo de música ruim mesmo, apesar de que mesmo entre os ruins há diferenças qualitativas. Mil vezes um Axé ruim que um Jazz pau mole.

Pra complicar, nem toda música de mercado é pop, ou pode ser pop pensada sob um aspecto, e não sob outros . E em outros momentos ainda, a divisão entre pop e não pop não serve absolutamente para nada.

Tudo isso pra falar que esse disco do Jamiroquai se enquadra na categoria pop-pop de ótima qualidade (além do que a base é música de crioulo, e aí já viu).




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